CNT relata que as concessões apresentam maior percentual de estradas classificadas como “ótimas” e “boas” em comparação com as públicas – Foto: Divulgação
A privatização das rodovias no Brasil é um tema que gera debates no cenário nacional. Como a situação das estradas é muitas vezes criticada devido a problemas de conservação e segurança, muitos se perguntam se a iniciativa privada pode oferecer soluções pertinentes.
Segundo a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), mais de 26,5 mil quilômetros de estradas estão sob a administração da iniciativa privada no país.
Já a série “Parcerias: A provisão de infraestruturas de transporte pela iniciativa privada”, da CNT, relata que rodovias sob concessão recebem em média 2,3 vezes mais investimentos por quilômetro do que as sob gestão pública. O levantamento estima que 46,7% da malha federal pavimentada esteja sob gestão privada até 2025, com investimentos de R$ 120,2 bilhões.
A privatização pode resultar em melhorias significativas na qualidade das estradas e na gestão de recursos, além de potencialmente reduzir os custos para o governo.
Neste contexto, é importante analisar tanto as vantagens quanto os desafios que essa abordagem pode trazer, uma vez que envolve não apenas investimentos, mas também a responsabilidade do Estado de garantir o interesse da sociedade.
O que é a privatização de rodovias
A privatização das rodovias no Brasil refere-se ao processo de transferência da gestão e operação de estradas públicas para empresas privadas. Essa ação visa melhorar a infraestrutura viária e a qualidade dos serviços oferecidos aos usuários.
As rodovias, quando privatizadas, são administradas por empresas que assumem a responsabilidade pela manutenção, operação e cobrança de pedágios.
A privatização pode trazer diversos benefícios, entre os quais se destacam os investimentos, uma vez que as empresas privadas alocam recursos para melhorias nas estradas e incentivam a inovação tecnológica. Esses fatores visam contribuir para uma infraestrutura rodoviária mais moderna.
Além disso, a gestão privada tende a ser mais eficiente, pois costuma adotar novas tecnologias e práticas administrativas. Outro ponto positivo é que, quando há concorrência, isso pode resultar em um aumento na qualidade dos serviços prestados.
Vale lembrar que a implementação da privatização das rodovias no Brasil ocorreu a partir da década de 1990. As concessões rodoviárias começaram com o Procrofe (Programa de Concessões de Rodovias Federais), visando reduzir os gastos públicos. Desde então, o Brasil realizou quatro etapas de concessões, que abrangem trechos importantes como BR-116, BR-101 e a Ponte Rio-Niterói.
Com o passar dos anos, a privatização das rodovias no Brasil se expandiu, introduzindo diferentes modelos de contrato. A ampliação da malha rodoviária privada inclui parcerias entre governo e iniciativa privada.
Benefícios ou não da privatização de rodovias
Entre os principais benefícios, destaca-se a eficiência operacional. Empresas privadas geralmente implementam gestão moderna e tecnologias avançadas, resultando em melhores condições de uso.
Estudo da CNT aponta que as concessões apresentam maior percentual de estradas classificadas como “ótimas” e “boas” em comparação com as públicas. As rodovias concedidas também registraram uma redução de 61% no índice de mortalidade entre 2010 e 2021.
As concessionárias utilizam tecnologias avançadas para monitoramento, segurança e gestão, incluindo sistemas como “free flow” para cobrança de pedágio proporcional à distância percorrida.
Melhorias na infraestrutura são observadas após processos de privatização. Com investimentos adequados, as rodovias recebem manutenção regular, o que resulta em segurança para os usuários.
Por outro lado, a expansão da participação privada não elimina a responsabilidade do Estado, especialmente em rodovias menos atraentes economicamente. Medidas como maior segurança jurídica, estímulo à participação de empresas internacionais e modernização dos contratos são necessárias.
Por sua vez, a privatização pode gerar aumento nas tarifas. O custo do pedágio pode se tornar um obstáculo, principalmente em trechos onde a concorrência é limitada. Isso traz preocupações para aqueles que dependem dessas vias para ir e vir.
Outro ponto é que a privatização pode levar a uma desigualdade regional. Regiões menos rentáveis podem ser negligenciadas, já que o foco das empresas é obter lucros. Isso pode afetar a interconexão entre diferentes áreas do país.
Desafios e críticas à privatização
Apesar das vantagens, existem críticas em relação à privatização das rodovias no Brasil.
Segundo a Agência Brasil, o governo federal planeja investir R$ 110 bilhões em rodovias concedidas à iniciativa privada entre 2024 e 2026, a partir da revisão de 14 contratos considerados problemáticos, que apresentam desempenhos insatisfatórios e deficiências técnicas e financeiras.
Essa revisão, iniciada pelo Ministério dos Transportes em setembro de 2023, busca melhorar a gestão e a infraestrutura das estradas. O Programa de Otimização de Contratos de Concessão Rodoviária foi desenvolvido com base em uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), que permite a renegociação dos contratos sem a necessidade de novas licitações.
Essa abordagem visa reativar obras que estavam paradas devido a problemas financeiros, possibilitando ajustes por meio de termos aditivos. Caso a renovação não seja viável, o TCU pode aprovar a relicitação dos contratos, permitindo que novos interessados assumam a gestão das rodovias.
O presidente Lula destacou que a colaboração com o setor privado é essencial para o desenvolvimento das obras, visando beneficiar tanto os empresários quanto os usuários das rodovias.
O ministro dos Transportes, Renan Filho, explicou à Agência Brasil que a otimização dos contratos inclui a discussão sobre obras, prazos e tarifas, para garantir que as rodovias, especialmente nas regiões economicamente mais dinâmicas, possam ser modernizadas e ampliadas.
Impactos da privatização
A privatização das rodovias no Brasil traz impactos significativos que permeiam tanto a economia quanto a qualidade da infraestrutura.
Segundo Marco Aurélio Barcelos, diretor-presidente da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias), um dos obstáculos é a atratividade dos leilões, especialmente com a quantidade de projetos em andamento em diferentes estados, como São Paulo e Minas Gerais.
Isso pode ser um problema porque, para que esses eventos sejam bem-sucedidos, é necessário atrair um número suficiente de investidores e operadores qualificados que estejam dispostos a participar.
Embora os governos estejam buscando soluções para melhorar a viabilidade financeira dos projetos, a modernização da matriz de riscos e as regulamentações ainda precisam ser aprimoradas.
Além disso, dois pontos críticos emergem, segundo Barcelos: o custo médio ponderado de capital (WACC) e a precificação dos investimentos, que têm impactado a capacidade de atrair investidores para novos projetos.
Por sua vez, a implementação de sistemas como o free flow, que permite a passagem de veículos sem a necessidade de parar para pagamento de pedágio, representa um avanço significativo na modernização da infraestrutura.
A integração de ferramentas digitais, como portais de pagamento e funcionalidades na Carteira Digital de Trânsito, pode transformar a gestão das rodovias, tornando-as mais acessíveis e seguras, na opinião de Barcelos, veiculada na Agência Infra.
A sustentabilidade e a resiliência das concessões também se destacam como temas essenciais para o futuro.